DERROTA INDIGNAA
Copa de 1990 foi a primeira a que assisti com interesse e total consciência do que estava acontecendo. Em
1986 estava mais preocupado em jogar bola com meu primo do que em assistir aos jogos. Na memória ficaram apenas
flashes desconexos, como o Brasil entrando em campo no jogo contra a Argélia (a bandeira dos africanos me marcou visualmente), o Zico perdendo o pênalti, meus pais e meus tios decepcionados com a eliminação. Em
1982, nem se fala. Tinha apenas 2 anos e não fazia idéia de que Copa do Mundo existia. Por isso, a minha estréia como telespectador de Copas foi mesmo em 1990. No colégio, a febre era o álbum de figurinhas da Copa. Foi o primeiro que completei na vida. Lembro-me até hoje de conseguir o número 20 dos Estados Unidos, o maldito último cromo (não-autocolante, claro), com um garoto da 3ª série, numa operação que mais pareceu uma troca de malas de dinheiro, e de no dia seguinte distribuir meu gigantesco bolo de repetidas no recreio.
Isso aconteceu antes da Copa começar. Eu não fazia idéia do que estava por vir. Na época, não sabia o quão desacreditado era o time comandado por Lazaroni. Para mim aquela era A Seleção Brasileira, a primeira que eu via realmente jogar, e parecia natural que os tri-campeões chegariam facilmente ao tetra. Quando o Brasil venceu todos os jogos da primeira fase, achei que estava no papo. Mas como todo mundo sabe, a alegria não durou muito. O gol de Caniggia despachou os brasileiros nas oitavas-de-final, na pior campanha desde 1966. Foi horrível: meus primos chorando, minha prima triste porque o avô dela provavelmente não veria o Brasil ganhar outro título, eu amaldiçoando aquele álbum de figurinhas estúpido. Só mais tarde eu fui descobrir que o time no qual eu depositara tanta esperança era considerado um dos mais medíocres da história das seleções.
Quando o Brasil caiu ontem, novamente diante da França, me peguei pensando naquele Argentina 1 x 0 Brasil, e em como a derrota de 16 anos atrás foi muito mais digna. O Brasil tinha um time fraco, muitíssimo criticado e, mesmo assim, lutou até o último minuto contra a evidente superioridade Argentina. Podia-se acusar o time do Lazaroni de tudo, menos de apatia. Alguns dizem até que o jogo da eliminação foi o melhor da seleção naquela Copa. Ontem, porém, com um time de estrelas milionárias, considerado o melhor do mundo e incensado desde o início da competição, o que se viu foi a vitória da indiferença, da indolência. Ou, como disse o
Gabes, a vitória da meia do Roberto Carlos.
Só não digo que meu
post anterior foi profético porque era óbvio demais o que podia acontecer. Não por acaso, o gol da França contou com a participação fundamental dos nossos laterais recordistas. A falta que Zidane cobrou foi provocada por Cafu e a inoperância na marcação de Henry, que fez o gol, cortesia de Roberto Carlos e suas belas meias. Confesso, porém, que não esperava que fosse ser desta magnitude, que fosse lembrar tanto a Copa da França.
Sim, porque foi impossível assistir ao jogo de ontem sem se lembrar da final de
1998. A diferença - e o que torna a derrota ainda mais indigna - é que o comportamento da seleção em campo desta vez não pode ser atribuído a nenhuma convulsão, a nenhum evento bizarro e inesperado que pudesse desestabilizar o time. O Brasil perdeu simplesmente por ser o Brasil. Pela insistência imbecil de Parreira numa escalação fracassada, pela prepotência "sou-titular-na-marra" dos velhotes Cafu e Roberto Carlos, pelo desperdício de ter reservas no banco muito melhores do que titulares "experientes". Nunca vi um time entregar uma partida daquele jeito. De todas as seleções eliminadas nas quartas-de-final, nenhuma mereceu mais a derrota do que a brasileira.
Lazaroni pode dormir tranqüilo. Comparado com a falta de vontade de vencer da seleção que poderia-ter-sido-mas-não-foi, o time de 1990 ganhou até contornos heróicos.
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Se tivesse acontecido de outro jeito, eu provavelmente estaria fazendo vodu contra Zidane e cia. nas semi-finais. Mas como a desclassificação brasileira foi culpa dos próprios brasileiros (exceções feitas a Lúcio, Juan, Zé Roberto e Dida, que impediram um placar mais distendido), vou cantar a Marselhesa no jogo contra Portugal. Até porque, ao contrário de 99% do país, quero mais é que o Felipão se exploda.
No mais, será deveras injusto se Portugal chegar à final. Vá lá, mesmo detestando o Felipão, até admito que ele sabe unir os jogadores. Ele lutaram (literalmente) muito, mas chega. Um quarto lugar está de bom tamanho. Mais do que isso seria premiar a mediocridade. Sim, porque um time que não consegue liquidar em 120 minutos uma Inglaterra sem ataque (
Crouch na frente e ninguém para lançar a bola não conta como ataque), com um jogador a menos e um técnico sueco burro só pode ser medíocre. Palmas, no entanto, para o goleiro português, que é bom até no
Winning Eleven e foi o verdadeiro responsável por levar Portugal tão longe no torneio.
Minha torcida agora fica mesmo é com a Itália (mas se Alemanha ou França ganharem também não será de todo ruim). Avanti, Azzurra!